Defender a alegria como um destino...


Defensa de la Alegría

Mario Benedetti

Defender la alegría como una trinchera
defenderla del escándalo y la rutina
de la miseria y los miserables
de las ausencias transitorias
y las definitivas

defender la alegría como un principio
defenderla del pasmo y las pesadillas
de los neutrales y de los neutrones
de las dulces infamias
y los graves diagnósticos

defender la alegría como una bandera
defenderla del rayo y la melancolía
de los ingenuos y de los canallas
de la retórica y los paros cardiacos
de las endemias y las academias

defender la alegría como un destino
defenderla del fuego y de los bomberos
de los suicidas y los homicidas
de las vacaciones y del agobio
de la obligación de estar alegres

defender la alegría como una certeza
defenderla del óxido y la roña
de la famosa pátina del tiempo
del relente y del oportunismo
de los proxenetas de la risa

defender la alegría como un derecho
defenderla de dios y del invierno
de las mayúsculas y de la muerte
de los apellidos y las lástimas
del azar
y también de la alegría.

[in Antología poética, Alianza Editorial, 1999]

Embaixadores da Paz do fabuloso Circo das Estrelas no picadeiro Cósmico da Vida...



Embaixadores da Paz do fabuloso Circo das Estrelas no picadeiro Cósmico da Vida...

Respeitável Público!

Doutor Cafuné,
Enfermeiro Cosquinha,
Doutora Cócegas,
Enfermeira Risadinha,
Ezpirro,
Atchu,
e muitos outros
em suas travessuras
pra te tocar, desenhar
e iluminar o peito,
e te ver com um sorriso
em Companhia da Paz...

2008

(...)

Quando o circo chegava à cidade lá estava eu me enfiando no meio do povo para ver o desfile de carros que passava. Montada a lona e começando o “maior espetáculo da Terra”, logo, logo já ia descendo das arquibancadas de madeira para ficar bem no meio, e bem pertinho de onde acontecia aquela mágica. Era o primeiro a levantar a mão, todo animado, quando os palhaços chamavam “voluntários” para participar das brincadeiras e trapalhadas ali no picadeiro.

Circo Orlando Orfei, Circo Mágico Tihany... são nomes que ficaram marcados na memória, e tantos outros circos menores não foram esquecidos tão grandes era os sorrisos que despertavam. Anos 60, menino pequeno em Belo Horizonte, lá ia eu com Tia Cocota aos espetáculos montados em frente à Igreja de São Cristovão ali no IAPI. Já “mais maior de grande”, assistia dias seguidos aos espetáculos naqueles templos da arte do encantamento que se erguiam no antigo campo de futebol do Atlético Mineiro na Av. Olegário Maciel. Tantos outros parques e circos nos bairros distantes e nas muitas cidades por onde perambulei...

Ao vivo e a cores, pela televisão ou cinema, pelos livros e principalmente pelas vias da imaginação era eu que ia ao circo, ou era o circo que vinha a mim.

As travessuras dessa trupe da “Palhazçada” vieram lá do começo dos anos 80 nas Minas Gerais, nos encontros do Cantinho da Paz com o amor da saudosa Dona Augusta, de onde íamos às periferias distantes, pobres e esquecidas da cidade de Uberlândia para levar o pão e água, do corpo e da Alma, repartir os poucos mantimentos que tirávamos do próprio bolso e do coração para abençoar os dias do próximo, do desconhecido. A “Paz, Paz de Cristo”, que cantávamos no quartinho de costura minúsculo que cheirava a perfume de rosas brancas e Luas Cheias, se agigantava nos sorrisos tímidos que recebíamos daqueles que queriam tão somente encontrar esperanças e breve lenitivo no ritmo da vida, no embalo de outras cantigas que a gente inventava para fazer daqueles momentos um oásis, ou Jardim de Luz. A gente pensava que dava algo quando éramos aqueles que realmente recebiam. Sorrisos...

Porque também éramos tão miseráveis em conhecimento nas lições daquela escola do Espírito que frequentávamos, tanto quanto era a penúria material daqueles que íamos ao encontro, o que movia nossas pequenas e sinceras vontades era apenas dar um primeiro passo em direção a uma amizade simples com todos que íamos conhecendo. Assim, íamos conhecendo a nós mesmos, também, aprendendo dia a dia cada tijolo naquela obra da construção do Reino de Deus em nossos próprios corações.

Depois, com os jovens idealistas querendo ser realizadores de sonhos, do Grupo Espírita Paulo de Tarso (GEPT) saíamos para o Hospital Universitário e seus labirintos de corredores. Isso, para levar um “coloração” de papel nas tonalidades do arco-íris como se fora um simbólico emplastro a dizer que era possível, e até fácil de acontecer, deixar o peito aberto para que alguma Luz chegasse para fazer vibrar, sobre a dor mais pungente, uma nota de Amor que despertasse outras cantigas que falassem dos caminhos de encontro consigo mesmo, com os propósitos da Vida, da cura.

Daí nasceu o “Alegrin” feito de balas de chocolate com revestimento colorido, como pílulas sem contra-indicação para todos os que estivessem sofrendo de mal estares ou melancolias de razões desconhecidas, rabugice ou mau humor generalizado. Para todos esses padecimentos, a Alegria era o melhor remédio. Tomando também da medicação que às vezes receitávamos, engrossávamos a fila de adoecidos à porta do consultório do Dr. Hansen, junto com Dr. Nelson e toda uma equipe de benfeitores do Saltimbanco da Perfeita Alegria. Aquele Menino Pobrezinho de Assis abria as portas para o serviço amoroso a todos aqueles que realmente queriam realizar o milagre da cura de todas as nossas chagas da Alma.

A única receita para alguma chama de felicidade nesse mundo parecia que íamos aprendendo pouco a pouco, quando era fácil, fácil saber de cor e salteado o que estava prescrito: “amar ao próximo como a si mesmo”...

Naquele mesmo tempo encontramos estradas que faziam chegar à Cidade da Fraternidade, a Cidade das Crianças que um dia foram abandonadas e acolhidas em lares-família para que elas também não se perdessem nos tantos caminhos das tristezas da vida. Sob o brilho de noites estreladas, avistando mil constelações lá em cima e ao nosso lado pelas árvores empipocadas de vagalumes, histórias e canções de ninar embalaram muita gente grande, meninos e meninas feitos “Pingo de Gente”, como “pedrinhas brancas no ribeirão de minha vida”.

2012

Eu mal sabia que um dia, depois daquelas montanhas, chapadas e cerrados, chegaria à beira da praia para conhecer as profundezas do mar e bater o pé no fundo, e subir nas pétalas do Lótus florescido em Luz Ciano, além da beirada Violeta na Ponte do Arco-Íris, seguir pelo Caminho das Ascensões feito de saudades, de dores e amores de mãos dadas, batendo palmas e asas como pombas anunciadoras da Paz, rumo ao Lar onde nos esperam as Sete Irmãs...

Ir... mãos...
E, mãos se tocaram e se foram em notas de Silêncio que ainda ecoam...

(...)

Pés saindo do chão...

Oliveiras... Em ramos no colo da Madona com o Menino nos braços da Mãe da Luz - Lucy - depois de dilúvios de saudades nas estradas reais transformadas dos Peabirus... Uma Horta com aromas temperando aflições de 30 anos no reerguimento do Templo Interno... Ponto de chegada, de partidas e de partos da Pachamama reatando antigos laços em Alma - Inka - com o Umbigo do Mundo... Pedras voando, se inter-conectando... Páscoa da Terceira Iniciação no Altar da Afeição com Seres Ascendidos... Boas Novas da Cruz do Sul assinalando os marcos nos caminhos de re-encontros de irmãos-amigos na re-cordação da missão do Coração da Pátria... O Mestre Ferreira forjando espadas vivas nas oficinas da carpintaria dos corpos, sentimentos e pensamentos, a cortar os fios que imobilizavam os outrora bonecos manipulados pelas tristezas... Tudo veio, tudo aconteceu, tudo passou, tudo e todos vão juntos numa grande síntese... Anjos e fadas madrinhas nos libertando da noite daquele horto doloroso do passado, agora para o perfeito movimento e fluxo da vida, da Alegria, torneiras de Luz, pias e terapias do batismo palhaçal... Tesouros do Afeto apontado para o Coração da Galáxia... Caixa de Jóias do Amor Maior que se abre para trazer a Esperança ao mundo sofrido... Canteiros em flores de Oliveiras...

(...)

E lá, lá em cima e aqui dentro, além do arco-íris, além do belo horizonte que se abria aos sentidos mais aguçados estava o Outro Jardim. E, tendo acendido o coração à beira do Grande Lago junto às outras crianças, sentamos quietos e em expectativa a contemplar as infinitas belezuras naquele Circo das Estrelas.

Já não era eu que ia ao circo, nem era o circo que vinha a mim. Eu era o circo, e o circo era eu.

Éramos o circo em pessoa, cada um daqueles meninos e meninas, mímica dos olhos num círculo de beijos e abraços, abrindo ciclo de infinitas possibilidades nesse circo dançante, sorridente, apaixonada-mente, peito batendo tambores em fanfarras de espirais entrelaçando mais e mais gentes para apenas e, e-ternuradamente ser Alegria.

Agora, outra era de milagres da energia e matéria em mimetismo maravilhabolantes de mundos e estrelas faiscando, rebolando, re-vira-volta-voltando em dança, e-macacados trapezistas nos galhos da Árvore no meio desse Outro Mundo, re-evolucionando, re-volvendo navegante noutro Tempo/Espaço nesse circo-ser-ascendente estrelado por seres-cometas riscando todas as cores da Paz em palhaçadas pelos quatro cantos dos Céus se equilibrando nos fios desenhados de galáxias. Juntos nos sorrisos e com narizes vermelhos essas crianças são todas aprendizes de enfermeiros, doutores e embaixadores da Paz nesse fabuloso Circo das Estrelas no picadeiro Cósmico da Vida que se estende ao infinito.

Respeitável público, em tão sonhada e esperada Companhia da Paz, esses estão e agora são nos Terapeutas da Alegria!

Leo Nogueira Paqonawta
24 mai2012

"A beleza ímpar do momento presente"...


A força de Viver

Renê Schleiniger dos Santos*

Uma vez sentida a força dos sentimentos inspiradores, somos guiados a procurar situações, condicionamentos, pessoas, momentos enfim, que nos inspirem novamente, para que nos façam sentirmo-nos cheios de força e disposição frente à vida com seus desafios.

Mas tenhamos cautela, que não banalizemos essa busca, para que não façamos dela uma obstinação cega que nos fará apegar nas situações que nos inspiraram procurando-as novamente, tenhamos certeza de que tais repetições não serão mais tão emocionantes.

Podem nos ensinar, estes momentos mais inspiradores, que, eles mesmos, não são literalmente a coisa que nos proporcionam inspiração. Isto porque com o vivenciar repetitivo de uma determinada situação que gerou-nos inspiração sentimental, tal inspiração tende a perder intensidade.

E isto acaba por suscitar a nós mesmos, individualmente, os sujeitos que se auto-proporcionam inspirações sentimentais de acordo com as disposições íntimas que arregimentamos para viver os momentos da vida. Alegria, segurança, coragem, confiança, bem-querer, disposição e outros sentires que produzem carga sentimental positiva não são determinados, exatamente, pelos momentos que vivemos. Nós mesmos é que nos proporcionamos, nos momentos da vivência da vida, a beleza e a intensidade dos momentos, o que vem apontar os nossos próprios e livres condicionamentos mais íntimos: significados, hábitos, interpretações enfim, como o vetor, a via que nos decide a sensibilidade em nossas respectivas experiências vivenciais.

O que nos acontece nos momentos que poderíamos chamar de inspiradores é que as novidades que nele se envolvem nos são tão agradáveis e, ao mesmo tempo, objetivamente novas, que nos fica fácil fluir, intimamente, para bonitas paisagens sentimentais e, consequentemente, mentais. Mas à medida que tais eventos agradáveis vão nos ficando conhecidos, podemos muito bem continuarmos animados por belos sentimentos, mas, possivelmente, com menor intensidade – as coisas ali já não nos são tão surpreendentes assim!

Se você deixa-se aberto às novidades fluentes no momento presente, e não só fecha-se ao significá-lo como isso ou aquilo, você vai tornando-se capaz de sentir intensidade emotiva até mesmo nos seus momentos mais rotineiros e cotidianos de vivência. É uma questão de condicionamento, principalmente mental, para que você viva o momento presente realçando sua comunhão nunca repetitiva neste lugar onde todos nós vivemos.

Porém, se você, por exemplo, significa a reunião familiar do Natal com um “mais um encontro familiar”, você se fecha, você não poderá vislumbrar nada de novo nesta sua experiência se tudo correr conforme as convenções. Tudo lhe aparecerá repetitivo e, já, um tanto quanto cinza; os abraços e beijos mais nada significarão do que uma, digamos, “rasa socialização”. Você, aqui, é mecânico, quadrado! É o que mostra que sua mente está dinamizada para gerar-lhe emotividade somente diante de grandes sobressaltos e, pouco à pouco, nada mais poderá ser muito diferente para você, você vai criando significados inflexíveis para todas as suas experiências, para as mais corriqueiras e para as mais esporádicas, e, logo, de duas possibilidades uma: ou você se torna um excêntrico, extravagante e exótico, um doido mesmo, desajustado e marginalizado por, insaciavelmente, buscar experiências das mais variadas, ávido por novidades bem vívidas e visíveis à olho nu; ou você se torna um amargurado extremamente adulto e velho por sensibilizar os momentos vivenciais como repetições, totalmente recobertos por mesmíssimos significados criados por você mesmo. Em ambas as possibilidades, você estará a cristalizar o movimento sucessivo da vida que lhe toma, estará velando as novidades que estão a fluir, permanentemente, por tal vivo movimento da vida.

É fundamental para o cultivo do Amor alegre ou, em outras palavras, para o cultivo consciente de sentimentos inspiradores, que não levemos tão a sério o que acreditamos e o que significamos ao experimentar os momentos todos da vivência, é preciso e é oportuno permitirmo-nos o vislumbre, o ver acontecer do novo e desconhecido, é essencial a nossa abertura sensível para aquilo que nos é mostrado aqui e agora, buscando ver então, os movimentos inovadores que este momento presente nos permite nele mesmo.

Por isso, que queiramos ver a beleza ímpar do momento presente, e tenhamos certeza de que ele pode nos ser conhecido, porém, que não queiramos, com nossos conhecimentos, saber exatamente o que está acontecendo diante dos nossos olhos, que tais conhecimentos sirvam para o que, realmente, eles nos servem: permitir-nos comportamentos em que possamos lidar com aquilo que o presente momento nos apresenta. O momento agora é único, e muitas, muitas coisas poderiam ser vistas e feitas nele, ao passo que nosso conhecimento, se muito creditado, nos cega quanto às incontáveis possibilidades que este agora vivencial nos permite.

Muito crédito ao que pensas, torna pobre a sensibilidade que és, que podes ser! Dia após dia, verás, diante da unidade do momento presente, cenas repetidas. Arruinarás os incessante convites ao novo por sua incapacidade de admitir que há fatos novos e desconhecidos no ar deste momento presente.

É justamente este crédito ao conhecimento que nossos significados nos permitem, que decide o tamanho de nosso orgulho. Neste, cremos em certezas na posse do que conhecemos e, já, sem demoras, o mundo e a vida nos parecerá uma máquina, ou melhor, diversas máquinas que, alternando seus funcionamentos, nos produzem experiências em série que alternam somente a ordem das repetitivas coisas.

Eterno mostrar-se inovador que a viva existência lhe revela ininterruptamente. Revelação ininterrupta que o deixa livre para utilizar seus significados plena e orgulhosamente ou para notar – ou ao menos tentar notar – as novidades singulares do momento presente.

Você é que escolhe seu caminho diante da existência de sua vida e, dependendo do modo como você escolhe viver, você decide a qualidade da sensibilidade que serás, perante a vida. Se você quer que seus significados sejam sempre capazes de tudo conhecer para se sentir seguro e não vulnerável, cultivarás uma grossa carapaça para sentir a vida, pobre serás.

Mas, se decidires abrir-te à vida, confiar nesta entidade que te permite viver, pensar e, ainda, utilizar o que pensas como queres, não precisarás ridicularizar aquilo que acreditas ocorrer, apenas carregarás junto de teus pensamentos a benéfica dúvida acerca deles próprios, apenas estarás certo de que há coisas aqui, no momento presente, que teus pensamentos não estão ilustrando, te farás atento ao que há – ou pode haver – de novo neste agora em que vives. Nesta abertura que só depende de você mesmo, sentirás, sucessiva, o movimento inovador, nunca repetitivo, em que se pauta tudo o que nos envolve e que somos.

Você não é aquilo que acreditas ser, você é a possibilidade de acreditar nisto, ou não!

* Renê Schleiniger Dos Santos
 Participante dos Terapeutas da Alegria UFSC desde março de 2012

24 abr 2012

Arquétipo do Nariz Vermelho


Arquétipo do Nariz Vermelho

"O animal mais sofredor da Terra inventou o riso."
Friedrich Nietzsche

Mayra Lopes*

Já é tradição que o nariz do palhaço é vermelho. Mas para se reafirmar as tradições e entender mais acerca do mundo, tem que se primeiramente questionar o “Por que” de tal tradição. Parafraseando Fernando Pessoa: “Primeiro estranha e depois entranha”.


Quem usa um nariz vermelho e nunca se questionou sobre a existência, a história e o simbolismo do mesmo, tem feito um uso vazio, despido de ciência.


Seria simplista escrever que vermelho pode indicar poder, sendo a cor dos cardeais, ou ainda indicar uma luta, ou a cor que junto com o verde forma a decoração de natal. Pode-se defender que vermelho remete a sangue, e por analogia à vida; ao sangue de Cristo para os religiosos. Isso se dá porque a cor vermelha pode ser associada a inúmeros sentidos: é a cor da paixão para os apaixonados. A cor da alegria para uns e da pureza para outros.

Mediante a tal reflexão é preciso que se aprofunde não só na análise da cor, mas a aspectos profundos, pois o nariz vermelho do palhaço pode ser considerado um arquétipo.

Arquétipo, palavra de origem grega grafada: aρχή – arché, que significa principal ou princípio, remete ao primeiro modelo de alguma coisa. A palavra foi adotada pelo psiquiatra suíço Carl Gustav Jung indicando a forma imaterial à qual os fenômenos psíquicos tendem a se moldar, refere-se aos modelos inatos que são matriz para os fenômenos da psique. Ou seja, são tendências estruturais invisíveis dos símbolos, são representações, imagens que correspondem a alguns aspectos da situação consciente do sujeito. Possui como sinônimo a expressão “imagens primordiais”. Segundo Jung se originam da constante repetição de uma mesma experiência no decorrer de inúmeras gerações.

O termo refere-se, portanto aos símbolos presentes no inconsciente coletivo. O inconsciente coletivo é a consolidação da experiência ancestral da espécie, sendo formado pelo material psíquico. Uma analogia facilita a compreensão: o inconsciente coletivo é como o ar, que é o mesmo em essência em todo lugar, é respirado por todos e não pertence a ninguém. O conteúdo que forma o inconsciente coletivo são os arquétipos que funcionam como peças do quebra-cabeça que o inconsciente coletivo é.

A personificação da figura mítica seja ela o palhaço ou um herói é algo que acompanha a humanidade e tem um significado que vai além do plano real da existência e consolida o inconsciente coletivo e se insere no tempo e na história. A forma de pensamento universal possui não só a carga estética, mas também uma carga afetiva sobre a imagem, sobre o símbolo.

Assim tratar do nariz vermelho do palhaço implica em evocar todo o significado que o gerou. Associa-se assim a força da forma com a força da cor.

Quanto à forma, o nariz do palhaço, consiste em uma bola redonda, um círculo. O círculo remete ao ponto, muitos palhaços pintam só um ponto vermelho como nariz, e pode ser considerado como sinal supremo de perfeição, união e plenitude. O centro que encontra motivo na própria existência.

O nariz podia ser verde, rosa, laranja. Mas, só de imaginar o nariz de palhaço dessa cor tem-se estranheza, pois se estruturou no inconsciente coletivo que o nariz do palhaço é vermelho.

Na grande maioria das civilizações, em sua simbologia, o vermelho significa força, virilidade, feminilidade, dinamismo. É uma cor exaltante e até enervante. Impõe-se sem discrição. É uma cor essencialmente quente, transbordante de vida e de agitação.

Na arte e na antropologia, o simbolismo da cor refere-se ao uso da cor como um símbolo em todas as culturas e religiões, enquanto a psicologia da cor remete à análise do efeito da cor no comportamento e sentimento humano, distinta da fototerapia (o uso da luz ultravioleta para curar a icterícia infantil). É importante não confundir psicologia da cor com simbolismo da cor. Mesmo apesar do fato de o simbolismo da cor possuir um caráter psíquico.

O vermelho, do latim vermillus, é a cor do sangue, situado no limite do visível do espectro luminoso. Abaixo deste comprimento de ondas, o infravermelho, não é mais perceptível pela visão humana. Também é conhecida como escarlate ou encarnado. É cor-luz primária e cor-pigmento secundária, resultante da mistura de amarelo e magenta.

Evoca padrões de memória que se relacionam a cor do coração, ao fogo, ao sol, ao rubi, a lava quente dos vulcões, a revolução.

Analisando a cor vermelha no âmbito do nariz do palhaço por intermédio da sentença: "O nariz do palhaço representa os olhos, e os olhos representam a alma." Pode-se concluir que o nariz do palhaço é vermelho para chamar atenção do público por ser uma cor quente.

Serve como indicador da direção na qual o mesmo vira o rosto: o palhaço nunca movimenta o olhar, sempre move a cabeça em direção ao que observa o que por si só já consegue extrair risos.

Assim sendo, os olhos do palhaço tem de ser expressivos, tem que transmitir sentimentos, pois não precisam servir para indicar o que o palhaço olha. Não são portas de saída, mas de entrada, e dá acesso a alma do artista. Estabelece a relação palhaço - público, palhaço – outro. Permite que o sentir seja expresso pela forma e direção do olhar.

Os narizes são vermelhos porque zombam das ditaduras do ontem e do hoje, porque indicam que apesar da dor e sofrimento a vida continua, continua no centro do rosto, continua quente como o sol, continua apontando a direção na qual olhamos para lançar nossas almas nesse misterioso oceano a que chamamos vida.

Reproduzido de Mayra Lopes
24 mai 2009

* Mayra Lopes de Almeida Reis é Acadêmica de medicina e teologia, estudiosa de distúrbios do sono. Com formação em hipniatria, já fui instrutora de curso de primeiros socorros e pesquisadora cemiterial. Atualmente sou cientista recebendo bolsa pela FAPEMIG, ex-presidente do "Projeto Humanizarte" e da "Liga de Genética Médica e Malformações Congênitas" da FMIt. Fundadora e ex-presidente da Liga de Medicina Baseada em Evidências. Graduo-me com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva. Buscando atuar, pautada em princípios éticos, nos processos de saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, para assim promover a saúde integral do ser humano.

Fonte: Lattes



Leia também:


"Cara de palhaço, pinta de palhaço" na Folhinha UOL, sobre a lenda inglesa do nariz vermelho de palhaço clicando aqui.

Mundo do nariz vermelho: "O nariz do palhaço representa os olhos, e os olhos representam a alma..."


Mundo do nariz vermelho

"O nariz do palhaço representa os olhos,
e os olhos representam a alma."

Mayra Lopes*

Segundo relatos lendários os palhaços existem há mais de quatro mil anos, mas é algo deveras complexo conferir um momento, mesmo que histórico, para o surgimento do palhaço. Sua origem deve se confundir com a origem do riso humano, do ser que se empenha em alegrar o que sofre, o outro.

Na corte oriental o palhaço tinha uma função social que podia fazer inclusive o imperador alterar suas resoluções.

Lubyet, é uma palavra que significa homem frívolo, foi usada como designação dos palhaços da Ásia, que apareciam em teatros, apresentações religiosas e junto da realeza.

Na Malásia, os palhaços usavam máscaras de bochechas e sobrancelhas enormes, coloridos e com turbantes.

Com apenas um palhaço, é mais difícil fazer rir, a comicidade fica no âmbito da imitação, porém, os palhaços asiáticos e divertidos que ainda se pode ver são os “irmãos Penasar e Cartala”. Penasar comporta-se bem e é preocupado e angustiado, enquanto que Cartala faz tudo ao contrário. Essa discrepância de comportamento acaba por surpreender e provocar o riso.

No teatro da Grécia antiga, havia o hábito de após da encenação da tragédia o palco ser invadido por palhaços para apresentar sua versão dos fatos e fazer o público rir, para que não fossem com o pesar da tragédia pra casa. Tais palhaços centravam-se em ridicularizar exatamente o herói, conforme o anti-herói de Mário de Andrade, o Macunaíma. Segundo achados antropológicos, Hércules era o herói preferido dos palhaços que mostravam que os doze grandes feitos eram nada mais, nada menos que uma sucessão de coincidências e sortes.

Ao analisar tal fato, pode perceber-se que o palhaço tem uma função simbólica significativa, mostrando para a população que por vezes ela não é culpada de seu padecer, jogando a responsabilidade dos grandes feitos de heróis nas mãos dos deuses. No âmbito psíquico, isso faz com que seja diminuído o sentimento de culpa que resulta no sofrimento do indivíduo, e, ajuda a elaborar o luto da difícil situação ou do sofrimento. É por isso que palhaçadas aliviam a alma.

Para corroborar com tal informação, cita-se a obra “Pequeno tratado das grandes virtudes” de André Comte-Sponville: “O humor é uma conduta de luto (trata-se de aceitar aquilo que nos faz sofrer), o que o distingue de novo da ironia, que seria antes assassina. A ironia fere; o humor cura. A ironia pode matar; o humor ajuda a viver. A ironia quer dominar; o humor liberta. A ironia é implacável; o humor é misericordioso. A ironia é humilhante; o humor é humilde”.

Também na Roma antiga apareciam os diversos tipos de palhaços, com palhaçadas simples e infantis que faziam o público rir. Os palhaços podiam fazer o que o público tinha vontade, mas não tinha coragem. Cicirro, por exemplo, era um palhaço com touca de cabeça de galo que abria as asas e cacarejada e, Estúpido usava roupas de retalhos e os demais atores ficavam indignados com eles e lhes davam pancadas, o que causava riso. Quem nunca teve vontade de bater em alguém bobo? E assim, por realizar brincando um desejo oculto do público o episódio era um sucesso em risos.

Nas palavras do grande palhaço Charles Chaplin: "Se tivesse acreditado na minha brincadeira de dizer verdades teria ouvido verdades que teimo em dizer brincando, falei muitas vezes como um palhaço, mas jamais duvidei da sinceridade da platéia que sorria".

Com o fechamento dos teatros na idade média, e com a postura clérica de que o riso era pecaminoso, os artistas passaram a fazer seus números em feiras. Na Escandinava e Alemanha os palhaços eram denominados “gleemen”, e na França “jongleurs” que é sinônimo de malabarista. O palhaço era um artista que mesclava números de malabarismo, mímica, acrobacia, e contavam contos e cantavam cantigas. Em festividades, os grupos consistiam na principal apresentação das feiras, e os palhaços eram responsáveis por levar bolas presas em barbantes para ir batendo no público abrindo espaço para o número dos bailarinos. Podiam ainda levar vassouras e sair gritando pedindo espaço para as cantigas. Decerto as palhaçadas eram mais divertidas que as trovas.

Como a idade média é permeada por luta de poder e uma grande imposição de medo na população, tanto por parte da monarquia quanto por parte do clero. E, como não há de se viver sob tanto medo sem consolo a palhaçada floresceu nessa época, atingindo inclusive a corte na figura do bufão, ou bobo da corte, esses palhaços do palácio eram inteligentes sob o disfarce de estúpidos para alegrar a nobreza e fazer críticas a situação social. Afinal, quando a verdade vem disfarçada de brincadeira é mais aceita, e vai fazendo seu papel no inconsciente dos indivíduos.

Durante a idade média na Alemanha os palhaços subiram de status social sendo considerados alegres conselheiros, uma vez que falavam sobre uma realidade dura e desconhecida para a corte, mas de uma forma engraçada, sem cobranças e sem dores.

No fim da idade média os teatros aos poucos foram reabertos, com temáticas e representações de cunho religioso, ironizando a condição de criatura pecadora do ser humano. Havia preferência de que o narrador fosse um palhaço, porque com o riso o público não se cansava da encenação.

Foi com Shakespeare que os palhaços passaram a ter importância no teatro, porque o palhaço que outrora só fazia rir passa a fazer o público chorar nas tragédias assumindo conotações dramáticas.

Na Itália do século dezesseis, surgiram companhias que se tornaram muito populares com a “Comédia da Arte”. O palhaço passa a adquirir um perfil próprio, uma fantasia que o tornava um personagem reconhecido, bem como seus hábitos e características singulares. Tais personagens tornaram-se mais famosos que os atores até perdiam sua identidade diante do público, sendo reconhecidos pelo papel que desempenhavam tal qual ocorre com as novelas na atualidade.

Assim as trupes se estenderam pelo continente europeu, sofrendo adaptações que geraram nomes célebres na história, como o Pierrot que chegou até a atualidade.


O circo moderno como é conhecido foi criando pelo sargento Philip Astley por volta de 1766, com atrações que usavam animais como cavalos, e apresentações divertidas. O palhaço mais importante foi “Mr. Merryman”, que atuava a cavalo.

Só posteriormente surgiu o palhaço branco vestido com roupas brilhantes e gorro, o palhaço “clown”.

A partir daí os tipos de palhaço se distinguiram havendo o palhaço “augusto” que é o desajeitado e extravagante, o “toni” que é excêntrico, e todo tipo de arquétipo que causa riso. Surgiram também os números clássicos de palhaços ainda são vistos no circo. São eles: “O barbeiro de Sevilha”, “A estátua”, “A água”...

Já no século dezenove, os palhaços passaram a montar espetáculos de cunho teatral baseados nos clássicos da literatura mundial.

A figura do palhaço hoje está presente em brinquedos, no circo, nas ruas, no cinema, na TV, em eventos, e atingiu os Hospitais.

O indivíduo parece descobrir que onde tem vida humana é necessário o riso, e para tal a criação de novas formas de se fazer rir, o empenho de pessoas para fazer rir. Para tornar os sofrimentos da existência, que não são poucos, suportável.

Esse é o pilar que une a medicina aos primeiros palhaços, ao primeiro riso. Pois, a medicina cuida do outro, do outro doente, fragilizado, que precisa de remédios, carinho, companhia, conforto, consolo.

Mas como o ambiente hospitalar possui regras impostas pelos processos do adoecer, do cuidado com a doença, os palhaços que vão para o hospital precisam ter conhecimento em ambas as áreas, a de fazer rir e a do cuidado com a saúde.



Afinal, é preciso olhar clínico para cuidar do corpo, mas também é fundamental o posicionamento da arte para aliviar a alma.

Reproduzido de Mayra Lopes
13 de mar 2009

* Mayra Lopes de Almeida Reis é Acadêmica de medicina e teologia, estudiosa de distúrbios do sono. Com formação em hipniatria, já fui instrutora de curso de primeiros socorros e pesquisadora cemiterial. Atualmente sou cientista recebendo bolsa pela FAPEMIG, ex-presidente do "Projeto Humanizarte" e da "Liga de Genética Médica e Malformações Congênitas" da FMIt. Fundadora e ex-presidente da Liga de Medicina Baseada em Evidências. Graduo-me com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva. Buscando atuar, pautada em princípios éticos, nos processos de saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, para assim promover a saúde integral do ser humano.

Fonte: Lattes

Respeitável público!



Respeitável Público!

Doutor Cafuné,
Enfermeiro Cosquinha,
Doutora Cócegas,
Enfermeira Risadinha,
Ezpirro,
Atchu,
e muitos outros
em suas travessuras
pra te tocar, desenhar
e iluminar o peito,
e te ver com um sorriso
em Companhia da Paz...